…dizem-nos que já estamos no ano de 2020!. (Tell us that we are already in the year 2020)!.
…nós, quando a situação nos permite e a saúde também, usamos algumas comodidades que nos oferece a nossa caravana, a que carinhosamente chamamos de “White Fox”, (Raposa Branca) e, vamos viajando para não ir a lugar nenhum, porque um bom viajante não tem planos fixos, ou seja, não tem intenção de chegar, porque quando chega, verifica que quase todos os outros estão errados sobre o que dizem a respeito do resto do mundo, que muitos, infelizmente ainda não o viram!. (We, when the situation allows us and our health too, use some amenities that our caravan offers us, which we affectionately call “White Fox”, and, traveling to not go anywhere, because a good traveler has no fixed plans, that is, he has no intention of arriving, because when he arrives, he finds that almost everyone else is wrong about what they say about the rest of the world, that many unfortunately have not yet seen it)!.
…era quase noite para nós mas, de acordo com o “Meridiano de Greenwich”, que marca a hora no relógio do Royal Observatory, em Greenwich, na cidade de Londres, quando o sol está no seu ponto mais alto e, que são exactamente 12.00 horas e que depois, marca o ponto de partida para todos os fusos horários do mapa, onde cada 15 ° de longitude representa a diferença de uma hora no tempo, como tal, na zona onde viajávamos, continuava com a luz do dia, tal como se fosse manhã!. (It was almost night to us, but according to the Greenwich Meridian, which marks the time on the Royal Observatory clock in Greenwich, London, when the sun is at its highest and it is exactly 12.00 hours and then marks the starting point for all time zones on the map, where each 15 ° longitude represents the difference of one hour in time, so in the area where we were traveling, it was still daylight, as if it was morning)!.
…parámos para comprar gasolina, apreciar o cenário e comer algo, numa cidadezinha de cruzamento de estradas, no norte do estado de Montana, já próximo do Canadá, procurando um daqueles restaurantes de estrada, cujo parque de estacionamento estava quase cheio, que logo nos deu a entender que devia ser uma coisa boa!. Ao nele entrar-mos, chegámos à conclusão de que não era bem um restaurante de estrada, era quase como uma sala de espera, ou mesmo uma antiga loja de conveniência, onde se podia comer!. (We stopped to buy gas, enjoy the scenery and have a bite to eat in a small road crossing town in upstate Montana, near Canada, looking for one of those roadside restaurants whose parking lot was almost full, soon hinted that it must be a good thing!. As we entered it, we came to the conclusion that it was not quite a roadside restaurant, it was almost like a waiting room, or even an old convenience store where you could eat)!.
…tudo aqui se processava com uma certa lentidão, num cenário de modesto conforto onde os produtos eram frescos!. O atendimento quase pessoal, perguntando de onde vínhamos e para onde íamos, falavam com sotaque do norte, quase cantando, com a particularidade de, perante a nossa aparente idade, recomendarem e venderem pão de trigo, cevada ou milho, incluindo tipo português, ainda quente, o que nos deu algum motivo de curiosidade!. (Everything here took place slowly, in a scenario of modest comfort where the products were fresh!. The almost personal attendance, asking where we came from and where we were going, spoke with a northern accent, almost singing, with the particularity that, given our apparent age, they would recommend and sell wheat, barley or corn bread, including Portuguese type, still hot, which gave us some reason for curiosity)!.
…era gente simpática e modesta, não traziam o papel da ementa com as fotos dos pratos que serviam, com o preço e números, onde nunca aparecem os zeros, pois todos terminam em “99 cêntimos”!. Nem, olhando para o relógio, diziam com um sorriso profissional que era o momento de “Happy Hour”, que para quem não sabe, é um termo de marketing para uma época em que o local oferece descontos em bebidas alcoólicas ou aperitivos grátis de coisa já descontinuadas!. (Were friendly and modest people, they did not bring the role of the menu with the photos of the dishes they served, with the price and numbers, where the zeros never appear, because all end in “99 cents”!. Nor, looking at the clock, said with a professional smile that it was the time for “Happy Hour”, which for those who do not know, is a marketing term for a time when the place offers discounts on free alcoholic drinks or snacks already discontinued)!.
…trajavam com roupas modestas e folgadas, não traziam o nome desenhado em letras bonitas na lapela da blusa e, entre outras iguarias regionais, também vendiam uns deliciosos pãezinhos de canela e umas sanduíches de carne assada de búfalo, que consideramos umas das cinco melhores sanduíches que alguma vez já tivemos!. E claro, tudo isto acompamhado de um café forte e bem quente!. (Dressed in modest, loose-fitting clothing, did not carry the name drawn in beautiful letters on the lapel of the blouse and, among other regional delicacies, also sold delicious cinnamon rolls and buffalo roast sandwiches, which we consider one of the five best sandwiches we have ever had!. And of course, all this accompanied by a strong and very hot coffee!.
…explicamos tudo isto com algum pormenor porque nós, viajantes do tempo, adoramos este cenário de ambiente algo modesto, dizendo com algum orgulho, que foi no meio desta gente que nos fizemos gente, lá na nossa aldeia do Vale do Ninho d’Águia, naquela encosta agreste da montanha do Caramulo, na Europa, onde os invernos eram frios, longos e escuros!. (We explain all this in some detail because we, time travelers, love this rather modest environment scenario, saying with some pride that it was among these people that we became people there in our village of Valley of the Eagles’s Nest, on that rugged slope of Caramulo Mountain in Europe, where winters were cold, long and dark)!.
…longe daqueles senhores do mundo, que infelizmente ainda estão acordados e atentos, escarrapachados nas suas mansões “badalhocamente” ricos e extraordinariamente felizes, onde entre outros pormenores, alguns enriqueceram explorando violentamente as pessoas e a natureza, pouco se importando com o bem estar dessas pessoas e a conservação dessa natureza, inventando máquinas e reinventando novos escravos, que por acaso até somos nós, os outros, os consumidores, ou seja, o tal resto da população que por cá vai sobrevivendo!. (Far from those gentlemen of the world, who are unfortunately still awake and attentive, strewn in their “badly” rich and extraordinarily happy mansions, where among other details, some have enriched themselves by violently exploiting people and nature, caring little for good to be of these people and the conservation of this nature, inventing machines and reinventing new slaves, who happen to be us, the others, the consumers, that is, the rest of the population that survives here)!.
…e dizem-nos que já estamos no ano de 2020!. (And tell us that we are already in the year 2020)!.
…sim, na verdade estamos no ano de 2020, onde as pessoas navegam na internet, sabem a marca e os preços dos carros topo de gama, sabem os nomes de quem nos saqueia a vida e suga o resto do nosso sangue, mas é neles que vão votando, enquanto continuam à espera de um milagre ou duns trocos que nós os velhos, ainda vamos guardando para lhes deixar, sempre desejosos de saber se o político corrupto ou o jogador de futebol se zangou com a tal “gaja” que tinham comprado com os seus milhões e, se ainda vive com eles!. “Gajas” essas que, (nada temos em contra, até achamos óptimo), lhes vão sacando algum, talvez esperando por outra oportunidade para aparecer!. (Yes, it’s actually 2020, where people surf the internet, know the make and prices of high-end cars, know the names of those who plunder our lives and suck the rest of our blood, but It is in them who go on voting, while still waiting for a miracle or some change that we old men are still keeping to leave them, always anxious to know if the corrupt politician or the football player got angry with such a “girl” that they had bought with their millions and, if they still live with them!. “Girls” who, (we have nothing against, until we think it’s great), will draw some, perhaps waiting for another opportunity to appear)!.
…sim, na verdade estamos no ano de 2020, longe, mesmo muito longe da época em que as crianças, afinal já eram homens com calos nas mãos, pés descalços e um pedaço de broa no bolso das calças remendadas nos joelhos e no cú!. (Yes, it is actually 2020, far, far away from the time when children, after all, were men with calluses on their hands, bare feet and a piece of bread in the pocket of their knee-length trousers and ass)!.
…da época em que as raparigas ainda meninas, já eram mulheres de tranças feitas ao domingo de manhã antes da mãe as levar à missa, de vestidos ou saias e blusas de pano riscado ou cotim, algumas descalças, com os braços cansados de dar colo aos irmãos mais novos e, de rodilha na cabeça para aguentar o peso dos cestos de roupa para lavar no ribeiro, dos molhos de lenha apanhada depois da tempestade na floresta, ou dos molhos de erva para alimentar o gado!. (From the time when girls were still girls, they were already braided women made on Sunday mornings before their mother took them to Mass, in dresses or skirts and blouses of scratched or crocheted cloth, some barefoot, with arms tired of lap the younger siblings, and roll their heads to support the weight of the laundry baskets, the bundles of firewood caught after the storm in the forest, or the bundles of grass to feed the cattle)!.
…da época onde as mães eram mulheres sobretudo boas parideiras, vivendo com companheiros rudes, de cara amargurada pela dificuldade da vida dura que levavam, nem sempre amáveis, gente que trabalhava de sol a sol e esperava a sorte de alguém levar uma das suas “cachopas” para a cidade, para ir “servir” para casa de gente de posses, pois seria menos uma malga de caldo para encher e, uns tostões que recebiam, no final de cada mês!. (From the time when mothers were mainly good-looking women, living with rude companions, bitter-faced by the hard life they were carrying, not always lovely, people who worked from sun to sun and hoped that someone would take one of the their “cachopas” to the city, to “serve” to the house of people with possessions, because it would be less a broth to fill and some pennies they received at the end of each month)!.
…da época onde os homens, alguns tinham profissões com grande esforço físico, como ferreiros, moleiros, agricultores, cavadores, rachadores, padeiros ou pescadores, com muitas horas de sono por cumprir, serviam-se da mulher pela madrugada, enquanto os filhos dormiam numa enxerga a seu lado, cultivavam as leiras que tinham ao redor da casa e, entre um jogo de sueca e duas malgas de vinho na taberna, que lhes fiava, até receberem a féria ou a venda de alguma ave, animal doméstico ou algum outro produto agrícola, trabalhando, trabalhando, conseguindo dar ao seu dia, mais que as 24 horas que realmente ele tinha!. (From the time when men, some had professions with great physical exertion, such as blacksmiths, millers, farmers, diggers, crackers, bakers or fishermen, with many hours of unfulfilled sleep, made use of the woman at dawn, while the their children slept on a pallet next to them, cultivated the windrows they had around the house, and between a game of Swedish and two bags of wine in the tavern they spun until they received the vacation or the sale of some bird, domestic animal or some other agricultural product, working, working, managing to give your day more than the 24 hours that it really had)!.
…e os filhos, eram coisas de mães e, quando corria “pró torto”, era o cinto das calças do pai que “inducava”, e às vezes a mãe também “provava da isca” para não dizer amém com eles!. (And the children, were mother’s things and when it ran “pro crooked”, it was the father’s trouser belt that “induced”, and sometimes the mother also “tasted the bait” not to say amen with them)!.
…e era assim que os filhos se faziam gente, que nós nos fizemos gente!. (And that’s how children became people, that we became people)!.
…e era uma festa quando algum filho começava a ler as letras gordas dum velho pedaço de jornal pendurado no prego da cagadeira da casa, que normalmente existia cá fora no quintal, dizendo alto e bom som que, “o rapaz já lê… ai que ele é tão esperto… Nossa Senhora o alumie… se Deus quiser, vai ser um homem e ter uma profissão”!. (And it was a party when some son was beginning to read the fat letters of an old piece of newspaper hanging from the house shit’s nail, which usually existed outside in the yard, saying loud and clear that, “the boy already reads… oh he is so clever… Our Lady alumie… God willing, will be a man and have a profession)!.
…é deste povo que temos algumas saudades!. Povo que lutou e viveu num tempo difícil, onde muitos nem sabiam as letras do seu próprio nome!. (This is the people we miss the most!. People who fought and lived in a difficult time, where many did not even know the letters of their own name)!.
Tony Borie, February 2020.
Amigo Tony Gostei da tua análise muito precisa e concreta. De facto era assim a vida do pobre. Eu embora tenha assistido a tudo isto, não passei totalmente estas cenas, pois como era filho unico, assim como neto unico, numa terra do litoral que é Cascais, tinha mais ou menos tudo sendo dos poucos da miudagem, que não me posso queixar totalmente. Noventa por cento dos jovens amigos, não estudaram por não haver posses. Eu tenho orgulho em dizer, que mesmo em criança ajudei alguns, repartia o meu lanche, coisa que a maioria não tinha. Um dia , e porque a minha mãe tinha uma pequena loja mercearia, mas que vendia tudo, roubei 2 pares de alparcatas para dar a dois irmãos da minha idade e que andavam descalços em pleno inverno. Claro que no outro dia eles apareceram “calçados”, tendo a minha mãe estranhado, porque os seus pais eram muito pobres, com a agravante de serem alcoolicos. Apertou comigo e eu disse-lhe a verdade, não tendo sido castigado, percebendo que embora ouvisse que a vida custava muito, reparei que houve um certo orgulho no meu gesto. Os meus pais trabalhavam muito, como já disse a minha mãe estava na lojeca, que não dava muito, porque a freguesia era pobre e era tudo para apontar que o pagamento, quando era, seria para o fim da semana. O meu pai era ferroviário na linha Cascais-Lisboa, e como era muito doente (febre reumatica), a maioria do tempo estava de baixa. Voltando aos meus amigos das alparcatas, um já faleceu, o outro vive muito bem, tendo usado para educar os seus filhos, esta cena que te contei, e outras mais como o repartir do lanche e das laranjas, peras e maças que eu tirava como se fosse para mim, para lhes dar. Enfim, no final da nossa vida, faz bem deitar cá para fora o que penso que foi de bom. Um grande abraço e continua escrevendo assim, dá para desarrumar o nosso “sotão” Roger
Tony Borie – Pieces of my life escreveu no dia sábado, 18/01/2020 à(s) 08:09:
> tonisaborie posted: “…dizem-nos que já estamos no ano de 2020!. (Tell us > that we are already in the year 2020)!. …nós, quando a situação nos > permite e a saúde também, usamos algumas comodidades que nos oferece a > nossa caravana, a que carinhosamente chamamos de “White” >